Resenha - La Planète Sauvage

Provavelmente pouca gente já ouviu falar sobre esse filme. É uma animação de ficção científica da década de 70. Eu assisti por recomendação da minha namorada, Andhora Silveira (leia a resenha dela aqui). Ela encontrou o título em algum site, pesquisando sobre filmes de ficção científica. Assistimos o filme juntos, mas deixei para fazer esta resenha bem depois dela.

Antes de tudo é preciso informar que esta resenha contém spoilers sobre a trama do filme, portanto se você prefere assistir antes de ler a resenha aconselho que pare com a leitura por aqui e retorne após assistir o filme.

La Planéte Sauvage (Fantastic Planet, título nos países de língua inglesa) é de 1973, dirigido pelo francês René Laloux e foi baseado em um livro intitulado: Oms En Serie.

História

A história se passa no planeta de Yon, este possui um único satélite (O Planeta Fantástico) o qual  é desabitado. Yon (apesar do seus habitantes serem humanóides) possui uma geografia, fauna, flora e cultura alienígenas. Não vemos aqui, praticamente, nada que lembre a terra. Tudo foi pensando num nível de detalhe impressionante para parecer o mais alienígena possível. Até as unidades de medida que utilizam são diferentes das nossas. 

Exemplo da flora de Yon

Fauna de Yon

Quanto a história somos apresentados a relação entre os Oms (seres humanos) e os Traggs (os alienígenas azuis e gigantes). Os humanos aqui são tratados como animais de estimação ou uma praga. Os que são domesticados são tratados como cachorrinhos, colocam roupas neles, ensinam truques, etc. Os que fogem e vivem nas ruas, parques e afins, são tratados como ratos. Precisam ser exterminados pois se reproduzem rápido demais e podem ser perigosos.

Inicialmente não fica claro como essa relação começou. Não sabemos se Yon é a terra no futuro, ou se é um planeta totalmente diferente e os humanos que chegaram ali foram escravizados. Os humanos que não vivem com os Traggs, desenvolveram uma cultura bárbara voltada apenas para sobrevivência. Eles caçam, se reproduzem e disputam territórios. Aspectos da vida na terra, como o pudor, quase não existe. Os humanos só cobrem os órgãos genitais. A sociedade é praticamente formada por tribos liderados pelos mais fortes e possuem um líder espiritual. Nenhuma tecnologia terrestre foi herdada, nem eles tem como fabricar.

Humanos vivendo em tribos

Quanto aos Traggs, eles são uma sociedade voltada para o desenvolvimento do indivíduo a partir do conhecimento. Eles valorizam o conhecimento, meditação, etc. Não vemos guerras, nem conflitos entre eles. A sociedade é organizada a partir de um conselho, aparentemente os mais sábios, e as decisões são tomadas abertamente com todos os Traggs presentes. Eles possuem habilidades mentais e de transmutação. Não vemos distinção entre pobres e ricos, nem nenhum tipo de comércio. Todas as casas são iguais e os bens e vestuário bem semelhantes.

O Conselho tomando as decisões

Eles parecem não precisar comer constantemente, e a contagem dos dias são diferentes. Eles vivem bem mais que os humanos e sua reprodução acontece de tempos em tempos. O grande prazer dos Traggs está na meditação, tanto que o marco da vida deles é sua primeira meditação. 

Essa parte é bem surreal, pois quando meditam uma esfera contendo a mente do Tragg sai da cabeça dele e  vai flutuando pelo planeta.

Meditação Tragg

A trama começa quando uma Tragg e seu pai encontram uns garotos torturando uma fêmea Om e seu filhote. Os garotos acaba matando a fêmea e deixando a criança viva. A Tragg, que se chama Tiva, se compadece do pequeno Om e o leva para casa para cuidar dele. A partir daí vemos como a relação entre o humano e a Tragg se desenvolve.  

Traggs torturando Oms

Tiva e seu Om

Os Traggs não frequentam escolas, todo o conhecimento sobre seu planeta está armazenado em um grande banco de dados. Esse conhecimento é transmitido para as mentes dos Traggs através de uma tiara. Tiva mantém o seu Om junto dela todo minuto, inclusive quando estuda (recebe o conhecimento através da tiara) por isso o humano acaba recebendo este conhecimento também. A partir de então ele vê que pode tirar vantagem dessa proximidade e começa a conhecer tudo o que pode sobre os Traggs. Ele até passa a acessar a tiara sozinho, os seus donos quando descobrem ficam furiosos.

Tragg aprendendo com suas tiaras do conhecimento

Num dado momento o humano foge da casa dos seus donos carregando a imensa tiara consigo. Quando ele  finalmente encontra uma tribo, tem seu valor provado ao salvar todos de equipamentos Traggs mortais para os humanos. Então toda a tribo passa a utilizar a tiara para aprender sobre o mundo que vivem e seus dominadores.

A relação entre Traggs e humanos já não era fácil, com o passar do tempo passa a ser insustentável. Os Oms se rebelam, e começa a Omization (extermínio total dos humanos). Mas agora os antigos bichinhos de estimação possuem conhecimento e começam a produzir equipamentos para fugir do planeta Yon. Quando finalmente conseguem, vão parar no Planeta Fantástico (a lua de Yon). Lá eles descobrem o que acontece com os Traggs quando eles meditam. 

A rebelião começa

A mente dos Traggs deixa o corpo e vão ocupar estátuas sem mente que ficam no Planeta Fantástico. Lá os Traggs trocam conhecimentos com outras raças do universo, que também meditam,  através de uma dança. Os Oms não sabem o que é isso, se assustam por as estátuas serem gigantes e quase os esmagar durante a dança. Então os Oms começam a destruir tudo com as armas que haviam colocado na sua espaçonave. 

A chegada dos humanos ao Planeta Fantástico e as estátuas

Traggs meditando, se reproduzindo e dançando

O caos chega em Yon, esse era o modo de reprodução dos Traggs e sua forma de crescer com o conhecimento de outras raças do universo. Sem suas mentes os Traggs enlouquecem ou morrem e não podem se reproduzir. Eles então são obrigados a firmar um acordo com os Oms. Estes podem ocupar o Planeta Fantástico desde que deixem as estátuas em paz. Os Oms que ficaram em Yon serão melhor tratados e poderão ir para junto dos outros, que agora habitam a lua do planeta, se quiserem.

Minha Opinião

A história impressiona por sua complexidade, além de mostrar uma cultura totalmente alienígena junto com um ambiente estranho e uma forma de reprodução ímpar. Os pontos sociológicos abordados na animação também são incríveis pois mostra como os humanos podem vir a ser tratados caso tivessem contato com uma raça superior, também nos faz pensar em como tratamos espécies do nosso planeta que consideramos inferiores.

Quanto a arte vemos uma animação completamente diferente, o artista decidiu retratar tudo isso como, praticamente, uma aquarela em movimento. O movimento lembra as primeiras animações para televisão, que era um tipo de stop-motion de uma história em quadrinhos. Penso que o objetivo é justamente chocar o espectador tanto na história quanto na arte, ambos chamam atenção. E não é nem um pouco estafante ou mal executado.

A animação toda é narrada, possui poucas falas e a trilha sonora é igualmente alienígena. Combina com a proposta, pelo menos a que penso que seja, de retratar um ambiente alienígena em todos os sentidos. 

Para finalizar, resta dizer que é um excelente filme sobre alienígenas. É um ótimo filme cult que te leva a pensar sobre as atitudes do ser humano em relação ao tratamento que ele dá entre aqueles da sua própria espécie, entre vários outras reflexões que podem ser invocadas durante e após o assistir do filme. 

Para mim foi um deleite quanto ao cuidado que tiveram ao criar toda uma cultura alienígena e um planeta com clima, fauna, flora e geografia únicos. Todo fã de ficção científica deve assistir essa animação! 

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