sexta-feira, outubro 14, 2011

House Rules IV: O D20 e o "problema das classes"



Eu comecei a jogar RPG em 2002 com o saudoso 3D&T. Por muito tempo este sistema foi perfeito, jogávamos por horas em diversos cenários. Desde Arton até U.F.O. Team, passando pelas adaptações de animes (que era o que mais a gente assistia na época).

Com o tempo é normal tanto os jogadores como mestre comecem a perceber as falhas do sistema em que jogam. Começamos a perceber tais falhas e tentamos concertar. No entanto na maioria das vezes acabávamos desequilibrando o sistema.
Como tudo começou.

Chegou o momento que decidimos parar de tentar mudar o sistema e trocramos para outro que tinha o que a gente procurava. Conhecemos D&D 3.5 e entramos na era D20.


O Sistema D20 e suas Classes

Ficamos empolgados com todas aquelas classes, talentos, classes de prestígio, suplementos e etc. Nessa época comecei a frequentar os fóruns de RPG, conhecer muita gente, outros sistemas e outras opiniões sobre o D20 e seu sistema de classes.
Para muitos o sistema de classes do D20 limitava demais a construção de um personagem, para uns auxiliava e para outros era um sistema ultrapassado e que engessava a imaginação dos jogadores e mestres.

Para mim isso nunca foi um problema, eu sempre poderia criar personagens interessantes misturando as classes e dispondo de um pouco de paciência para evoluir até determinando nível para ficar do jeito que eu queria. Mas para outras pessoas que eu conheci isso era o pior, você ter que pegar outras classes e esperar esse tempo até o personagem chegar onde precisavam.

Por exemplo, uma vez alguém disse o seguinte:
Se eu quero fazer um personagem que tenha habilidades de caça tenho que comprar níveis da classe de Ranger. Se eu quiser um caçador medíocre posso me contentar com o 1º nível. Mas se eu quiser deixá-lo um caçador mais eficiente eu preciso investir bastante na classe de Ranger até pelo menos o 8º nível.
Para este indivíduo isso era perda de tempo. Ele queria poder comprar habilidades de caçador eficientes de cara. Tornar seu personagem um caçador de verdade rapidamente por causa do background que havia criado.

Outra coisa que ouvi muito as pessoas reclamarem era que os personagens ficavam bastante semelhantes. A classe Mago ou Feiticeiro, por exemplo, basicamente os conjuradores são diferentes apenas nas magias que escolhem, armaduras que usam (se usam), armas que preferem e alguns talentos. Segundo as pessoas que reclamavam o D20 não oferecia muita possibilidade de customização de personagens, a não ser que você comprasse várias outras classes, mesmo assim não era a melhor solução pois caminhava para o mesmo lugar.

Aí veio o True20, da GreenRonin. Neste sistema não existiam tantas classes, apenas 3 (Combatente, Conjurador e Especialista) e com essas três você podia simular qualquer outra classe do sistema D20, inclusive classes de prestígios e criar combinações novas e únicas.


Essas três classes foram desenvolvidas partindo do pressuposto que qualquer classe é uma especialização de um dessas 3 classes básicas. Por exemplo: O Samurai é um Combatente com poucas coisas diferentes. Um código de honra, armas e armaduras peculiares, poucas habilidades extras verdadeiramente únicas.

Praticamente todas as habilidades das classes básicas e de prestígio do sistema D20 foram transformadas em talentos e se você quisesse um Ranger puro era só identificar os talentos que compunham a classe do sistema D20 e comprar todos da maneira permitida.

O True20 também permitia que você montasse personagens únicos baseado na combinação de talentos. Você poderia fazer um Samurai/Monge sem precisar comprar mais de uma classe, era só comprar os talentos correspondentes e pronto! Com uma única classe genérica o jogador conseguia simular duas especializações ao mesmo tempo.


Classes são feitas de fato para limitar

Eu lembro que quando eu mestrava 3D&T eu odiava uma coisa: Cada personagem sabia fazer de tudo!
Apesar de 3D&T ter os kits de personagens (classes simplificadas), ele não barrava o jogador nas escolhas das vantagens. Portanto apesar de seu personagem só poder ter uma classe, ele podia simular qualquer outra comprando as vantagens certas! No fim das contas ele poderia saber fazer de tudo.

As características particulares de cada kit na maioria das vezes não valiam de nada. Por que se eu tenho um kit de Caçador, mas o meu colega tem um Mago e comprou as mesmas vantagens do kit Caçador ele é tão bom quanto eu nesta especificidade.

E eu odiava isso porque mesmo eu separando os personagens do grupo em missões diferentes, eles nunca tinham desvantagem nenhuma!

Não se engane eles sabem fazer de tudo!


As classes do sistema D20 impedem isso. Se seu personagem quiser ser bom em tudo ele terá que comprar vários níveis de várias outras classes (ou jogar como Mago). O fato de você demorar para chegar onde quer comprando níveis de outras classes é para isso, te desestimular. Fazer com desista disso e deixe as especificidades de cada classe em paz.
As classes de prestígio oferecem alguma customização e meios para chegar onde você quer sem invadir as especificidade de outras classes tanto assim.


Outra desvantagem: Muitas classes de prestígio

Como o sistema te desestimula a pegar várias classes básicas ao mesmo tempo ele precisa te dar possibilidades de customização de uma outra forma. Classes de Prestígio (CdP).

Classes de Prestígios para Clérigos e Paladinos

Classes de Prestígios para Conjuradores Arcanos

Classes de Prestígios para Aventureiros no Geral

Tais classes podem ser vistas como uma evolução da sua classe básica, ela torna tudo mais específico. Por exemplo, temos a classe básica Guerreiro e a classe de prestígio Cavaleiro (que pode ser acessada mais facilmente por classes combatentes).
Se você for um Mago e quiser acessar essa CdP, precisa esperar um bom tempo até que seu personagem tenha os talentos certos. As vezes você precisa comprar até alguns níveis de Guerreiro para poder acessar sua evolução. Se você começa com Guerreiro, rapidamente consegue essa CdP.

Mais uma vez o sistema te limita e impede que você invada o nicho de outras classes. Isso é bom. Mas, por outro lado, como esse é o único modo de customização oferecido, é necessário que toda e qualquer especialização de uma classe seja transformada em uma CdP.
E isso acaba gerando CdPs demais que (muitas delas) não valem a pena serem compradas. Elas só te dão alguns talentos que podem ser simulados na classe básica.

Por exemplo, a relação Guerreiro - Cavaleiro. Um Cavaleiro é um Guerreiro com (em boa parte dos casos) um código de honra, dinheiro e uma armadura. Isso tudo você pode providenciar via interpretação, background e etc. Sem a necessidade de comprar outra classe. Muitas vezes a CdP te oferece habilidades únicas mas que não valem a pena o esforço, as vezes é muito melhor evoluir o seu Guerreiro sem CdP.
E a nível de história se você chamar seu personagem de Cavaleiro, ele o será mesmo que não tenha níveis nesta CdP.


Mesmo com as CdPs os personagens são pouco customizáveis, existe solução?

Digamos que em sua mesa dois jogadores queiram a CdP Cavaleiro, eles precisam comprar os mesmo talentos para chegar até lá. Não precisa ser um gênio para perceber que basicamente serão o mesmo personagem com poucas coisas (mecanicamente falando) diferentes.

E se o sistema for criar diferentes tipos de Cavaleiros, terão que criar diversas novas classes e aí caímos no problema das várias CdPs específicas demais, pequenas e pouco relevantes.

Na época eu cheguei a sugerir o uso de árvores de talentos (talent trees, no original), um recurso muito usado em MMORPGs. Mas me disseram que no final das contas uma árvore de talentos e uma classe são a mesma coisa.

Essa semana eu estava lendo resenhas em alguns blogs e me interessei por uns suplementos do Pathfinder RPG e vi uma solução bem elegante para este problema. Nos suplementos Advanced Player Guide (APG), Ultimate Magic e Ultimate Combat. A solução se chama Archetypes.

O melhor dos três suplementos

É um excelente livro!

Dizem que é o mais fraquinho destes 3.

Basicamente são uma seleção de habilidades de classe novas que podem substituir as originais. E se o jogador optar por seguir todas as habilidades novas daquele Archetype ele passa a possuir a uma especialidade de uma classe básica! Se você prestar atenção verá que um Archetype é basicamente uma árvore de talentos, mas essencialmente mais leve.

Pelo que eu pude ver os Archetypes oferecem alguma customização, bem leve, mas não o suficiente para abandonar o conceito de CdP. Quando algo é complexo demais a CdP ainda é a melhor saída. Por exemplo: Para a classe Ladino do Pathfinder RPG o Advanced Players Guide oferece a CdP Mestre Espião (Master Spy, no original), creio que o nome seja auto-explicativo. No Ultimate Combat um Archtype oferecido é o Mestre das Facas (Knife Master, no original) que é um Ladino especializado no uso de lâminas pequenas, ele possui um talento que o permite esconder tais armas e conseguir um ataque crítico mais eficiente com as mesmas.

Como o Mestre das Facas não tem tantas habilidades assim, ele é um Archtype. Mas como o Mestre Espião possui habilidades mais complexas e variadas foi transformado numa CdP.
O mais interessante é que os Archtypes possuem talentos exclusivos e você escolher um não impede que escolha outro posteriormente. Mas tem que obedecer aos pré-requisitos é claro.


Eu já vi esse negócio de Archtypes antes...

É fácil de ver que os Archtypes nada mais são do que níveis de substituição. São habilidades que o jogador escolhe no lugar das habilidades da classe básica.

Os níveis de substituição (ou Archtypes) são uma excelente alternativa para customizar os personagens sem perder a mecânica das classes. Esse tipo de alternativa é bastante válida quando não se quer, ou não tem tempo para, modificar todo o sistema para que não perca o equilíbrio.

A solução do True20 é muito boa. Mas iria requerer toda uma conversão de habilidades de classe para talentos e o equilíbrio e várias outras questões precisariam ser avaliadas. Com os níveis de substituição você chega num bom nível de customização permitindo que os jogadores saiam um pouco da rotina.

Eu lembro que a primeira vez que fui apresentado a esta mecânica foi na revista Dragon Slayer #9. Na adaptação da animação Caverna do Dragão para D&D 3.5. Os autores da matéria sugeriam níveis de substituição para simular o ganho de novas habilidades do item mágico portado pelo personagem conforme o nível. Eles também serviam para substituir habilidades de classe que os personagens não demonstravam no desenho. Por exemplo: o Hank é Ranger mas nunca utilizou magia porém o seu arco simulava bastante magias e a cada episódios víamos habilidades novas.

DS #9

Em seguida vi essa mesma mecânica na Dragon Slayer #15, voltada para Os Reinos de Moreania. Aqui os níveis de subtituição são utilizados para simular Bárbaros de tribos específicas, Guerreiros de um determinado "centro de treinamento" e etc. Muito interessante e bem feito.

DS #15

Depois disso o mundo foi apresentado ao Pathfinder RPG com suas classes, mais habilidades e um Feiticeiro que possui linhagens sanguíneas, que são equivalentes aos níveis de substituição. Com essa mecânica aplicada no Feiticeiro, conseguimos criar conjuradores únicos com habilidades bem variadas. Mas sem a possibilidade de escolher mais de uma linhagem ao mesmo tempo. Essa tendência foi adotada no Tormenta RPG inclusive para outras classes como Rangers e Paladinos.

Várias linhagens, vários personagens.


Na minha opinião os níveis de substituição são a alternativa ideal. Ao invés de criar várias classes que oferecem poucas habilidades, é melhor criar um Archtype com níveis de substituição. Se quiser mais customização permita que os jogadores possam escolher mais de uma, caso contrário não permita.
Penso também que adotando essa mecânica várias CdP poderiam deixar de existir, como em Tormenta D20. Temos a CdP Carteador e Vigarista, estas poderiam ser Archetypes para um Ladino.

Poderíamos também tornar classes básicas mais genéricas, por exemplo: Eu sempre vi o Monge como um lutador marcial genérico. Mas se você for analisar ele é mais inspirado em artistas marciais orientais. Se eu quiser que meu personagem seja um Boxeador ou um lutador de Jiu-Jitsu eu finjo com a interpretação, somente. Uma alternativa seria criar estes Archtypes. O mesmo vale para Cavaleiro e tantas outras CdPs.


Concluindo

Os Archetypes são uma boa solução para a customização no sistema D20. Pode estar longe da customização que sonhamos mas é uma boa alternativa. Além disso ela pode ajudar a reduzir o número de CdPs existentes e a tornar classes como o Guerreiro mais interessantes. E você o que acha disso tudo?

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